terça-feira, 14 de agosto de 2007

PLANEJAMENTO E PESQUISA – o alcance real desta importante ferramenta.

Seguindo a linha temática que fala do planejar publicidade na transição de paradigmas e as mudanças que isto trás ao planejamento, falo agora sobre o relacionamento dos planejadores com a pesquisa, esta controvertida, porém indispensável ferramenta.

Parto de reflexões sugeridas há 13 anos por uma lenda viva do planejamento no Brasil: Julio Ribeiro[1]. A princípio, um texto antigo cujo teor corre grave risco de estar desatualizado. Mas, se me permitem filosofar só um pouquinho, julgo que em certa medida publicidade seja atemporal, e opera com elementos que estão aquém do aqui e agora, e é por isso que eu julgo que os postulados da física qüântica precisam ser estudados com carinho pelos planejadores.

Muitas vezes as pesquisas nos mostram aquilo o que já estamos todos carecas de tanto saber.

Escrevi há algumas semanas sobre uma polêmica levantada no blog do GP chamada de “Avestruz Esnobe” sobre uma pesquisa a respeito da preferência musical dos brasileiros, a qual mostrou que um produto considerado brega era o preferido, independente da classe social do consumidor, sendo mais consumido até que produtos considerados premium, mesmo quando divulgados de forma massiva e privilegiada pela mídia.

Será que já não sabíamos disso? Música Popular Brasileira – será que os grandes expoentes da MPB são tão populares assim, como o nome sugere?

Recordo ter lido uma entrevista com o Duda na qual ele falava sobre estratégias de propaganda política. Questionado sobre o uso das “baixarias” no horário gratuito como boatos, acusações, xingamentos e provocações entre candidatos, disse ele o seguinte: se fizermos uma pesquisa, 100% dos brasileiros afirmarão veementemente que não gostam de baixarias no horário eleitoral gratuito, mas... quem disse que realmente eles não gostam?!

Não raro os especialistas em pesquisa submetem-se à ditadura das fórmulas e softwares.

Por que fazer uma pesquisa para saber o que já se sabe? Por exemplo, para que pesquisar para entender a motivação do consumo do molho de tomate industrializado? Afinal, todos já sabemos que apesar do molho industrializado não estar à altura do caseiro, a praticidade motiva seu uso – diz Julio Ribeiro.

Estamos naquele patamar que muitos planejadores julgam perigoso: o feeling. E, se o feeling é perigoso, é porque ele oferece riscos.

Nós planejadores não podemos nos dar ao luxo de fazer investimentos a risco zero, como fazem os investidores estrangeiros que só deitam seus dólares por aqui sob compromisso formal do governo em arcar com os prejuízos caso a coisa degringolar. Nossos clientes investem seu dinheiro sob a garantia da confiança em nosso trabalho.

Se buscamos lucro para nossos clientes temos que entender que só alcançaremos sucesso se corrermos o risco de confiar em nosso feeling. Investimento risco zero é uma utopia, exceto é claro sob o aval do governo brasileiro, que não é o nosso caso.

Julio Ribeiro é um mestre em utilizar frases de efeito. Vejam esta: Não banque as irmãs da Cinderela.

Para pesquisar, antes é preciso saber perguntar. Só se pode pesquisar se antes definirmos de forma clara e objetiva aquilo o que queremos saber. Até aqui, o óbvio, mas ao contrário do que normalmente costumamos entender, ser claro e objetivo nem sempre significa ser simples e direto. E é neste momento que a habilidade do bom planejador manifesta-se.

Para ilustrar esta afirmação, tomemos o exemplo que Julio Ribeiro apresenta no mesmo texto, quando comenta sobre uma pesquisa que fez sobre inadimplência em prestações da casa própria.

Uma pesquisa comum não falaria nada além do que já se sabe: pontuais afirmariam que a prestação é prioridade do orçamento, e os inadimplentes afirmariam que alimentação é a prioridade. Uma pesquisa simples e tradicional com aquele questionário básico facilmente tabulado com softwares próprios não iria oferecer respostas para além destas.

Foi preciso pensar numa metodologia muito particular e diferenciada para chegar à conclusão de que vários fatores influenciavam na questão, tais como o prazer da sensação de estar driblando o governo, ou ainda o prazer de sentir-se esperto ao livrar-se dos juros ao pagar sob pressão judicial. A pesquisa descobriu que, excetuando-se aqueles com reais problemas financeiros, haviam alguns que escandalosamente investiam o dinheiro da inadimplência em especulação imobiliária.

Assim, para planejar hoje, há de se reservar uma grande parte de nosso tempo útil à contemplação. Não uma contemplação passiva, mas uma contemplação ativa, e mesmo especulativa para que a partir disso possamos, antes de encomendar uma pesquisa, entender com mais clareza aquilo o que precisamos saber e COMO precisamos saber.
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[1] Ribeiro, J. FAZER ACONTECER. Cultura, São Paulo, 1994. – Capítulo 07 – E AGORA, O QUE É QUE EU FAÇO COM ESTA PESQUISA? Págs. 63 a 68.

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