segunda-feira, 23 de julho de 2007

PLANEJAR NÃO É A ENGENHARIA DA PROPAGANDA. ENTÃO, O QUE É PLANEJAR?

Uma reflexão sobre “Nova Ciência, novo modelo, nova propaganda” de Jon Steel*.
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No Top de Planejamento deste ano de 2007, um colega colocou com bastante propriedade que a propaganda hoje não funciona mais como um “pregão de feira livre” onde vende aquele que consegue bombardear mais a cabeça do consumidor impondo marcas, ganhando quem grita mais alto. Este é um modelo no qual as marcas falam de sí para o consumidor.
Buscar modelos de como planejar propaganda é uma prática intensa entre os planejadores que normalmente trocam entre si estudos de cases de sucesso.
A cadeia produtiva da propaganda espera dos planejadores a previsibilidade de resultados, a certeza de estar atuando num futuro case de sucesso. Nada há de errado nesta mentalidade, exceto impor aos planejadores a responsabilidade total sobre o resultado final de uma campanha. Pressionados, buscam modelos calcados em procedimentos mecânicos que lhes dê segurança de atuação. Agindo assim passam a acreditar que estão trocando uma insegura aposta na sorte pela segurança de um resultado calculado.
Esta mentalidade exige auto-crítica – é impossível encarar o planejamento como se ele fosse igual à engenharia, que usa ciência e técnica para desenhar uma planta a partir da qual se constroem máquinas que garantem os resultados almejados.
Não é assim que se atingem os objetivos de um briefing.
É impossível planejar ignorando, em nome da técnica, a multiplicidade de variáveis e significados que surgem da percepção de uma campanha pelos consumidores, criando a ilusão de padrões de reação genéricos aplicáveis conforme classe e nichos. Os planejadores seriam no mínimo ingênuos se acreditarem que a partir da análise de uma série de cases de sucesso podem localizar a repetição de coincidências e criar uma “lei científica” aplicável à propaganda.
Como bem diz Jon Steel, “Em geral as melhores soluções publicitárias surgem do caos aparente”.
A propaganda deve compreender que ela se dirige a pessoas, e pessoas são de forma isolada e coletiva elementos extremamente complexos em suas reações, o que nos impede planejar propaganda como engenheiros planejam máquinas.
Há um restaurante de sucesso muito tradicional em São Paulo, o Sujinho, conhecido por servir a melhor bisteca paulistana. Qual planejador seria louco o suficiente para propor a um anunciante a associação de sua marca à sujeira, ainda mais no segmento alimentício?
Ainda em São Paulo há (ou houve) outro bar que ficou conhecido por ser freqüentado por pessoas que queriam desabafar dores de traição amorosa. Consolidada a tradição, foi apelidado de “Bar do Corno”, e começou a atrair curiosos e pessoas no perfil descrito, virou sucesso.
O negócio ia muito bem até o proprietário começar a investir nesta identidade institucional, começando pela reforma da decoração que explorou a fartar o ícone dos chifres. Passado algum tempo, precisou rapidamente refazer a decoração, desassociando o bar desta imagem sob risco de falência.
Ao planejar não podemos ignorar o fator sorte, e bons planejadores devem treinar o máximo possível seu feeling para perceber aquelas oportunidades que ocorrem uma única vez, e lançar a campanha no momento certo, nem antes, nem depois.
Jon Steel citando Chris Heath diz: "não são os planos imaginados que fazem a diferença, é a habilidade com a qual você usa os acidentes".
Então quer dizer que o trabalho dos planejadores é semelhante ao de médiuns que usam a intuição e desprezam o racional? Não, não se trata se simplificar as coisas desta forma, mas os desdobramentos dos novos modelos de propaganda são assunto para várias outras reflexões e estudos.
Fiquemos com a orientação de que a propaganda deve procurar aproximar-se das pessoas e senti-las, entendê-las não na perspectiva da busca de um modelo universal, mas acompanhando o consumidor como parceira, atendendo-o em cada uma de suas múltiplas nuances comportamentais, nem sempre lógicas.

* Steel, Jon. VERDADES, MENTIRAS E PROPAGANDA . Negócio Editora – págs. 23, 24, 25 e 26.

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